domingo, janeiro 27

Não há recompensa sem esforço

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É difícil ser breve quando se fala de um poeta que não cabe em si, de um poeta que extrapola sua própria personalidade ao ponto de em seus trabalhos subscrever-se por meio de heterônimos para dar vazão a toda sua criatividade.

Em apenas um dos poemas de Fernando Pessoa é possível encontrar fio para tecer muito discurso. O poema “Mar português”, tratado no post anterior, aparentemente simples, é na verdade muito rico de simbolismos e de conteúdos histórico e metafóricos.

Na terceira estrofe o poema apresenta uma metáfora muito interessante logo nos dois primeiros versos: “Quem quere passar além do Bojador / Tem que passar além da dor.”, versos que tentamos entender e elucidar aqui. Na medida do possível.

Escrito em 1922, o poema, que faz parte da fase nacionalista do poeta, é totalmente voltado a enaltecer os feitos de Portugal.

No momento histórico imediatamente anterior às Grandes Navegações os limites marítimos do mundo ocidental iam pouco além do Mediterrâneo. Cruzar o estreito de Gibraltar, ir um pouco acima pelos mares do Norte e aventurar-se um pouco abaixo pela costa africana já eram feitos épicos.

Bojador é um cabo que fica na costa noroeste da África, onde hoje é o Saara Ocidental. Até 1434, o Bojador era o limite, não só para portugueses, mas também para todos os povos peninsulares. O cabo Bojador era também conhecido como o “Cabo do medo” ou o “Cabo do não”. Pois em torno dele se dissipava um terror supersticioso, visto que a região era de difícil navegação e ninguém ousava ultrapassá-lo. Naquele ano o navegador português Gil Eanes, conseguiu o feito de ir além do Bojador. Desde então, em Portugal, o Cabo do Bojador passou a ter um grande significado, o significado de último limite do homem e do seu mundo.

Portanto, ir além do Bojador, como aludido no poema, significa superar seus próprios limites, ir além do mundo conhecido e descobrir novos caminhos, sejam eles geográficos, comportamentais ou tecnológicos.

O outro lado da mensagem do verso (Tem que passar além da dor) é que a superação de limites exige sacrifício, empenho e dor. Este é o outro limite a ser superado: o limite do próprio ser humano. Nada é de graça. Não há recompensa sem esforço.

Desde essa época o homem já superou muitos limites. Já cruzou o Cabo das Tormentas, já chegou á Lua, ao mundo virtual. Sabe-se lá aonde mais podemos chegar superando nossos próprios limites.

“Mar português” tem ainda muita riqueza a ser desvendada. Pegue um livro de Pessoa e lance suas esquadras ao mar!
Boa semana!
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O trabalho Não há recompensa sem esforço de Tony foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial 3.0 Não Adaptada.
Com base no trabalho disponível em http://vozativa2.blogspot.com.br/ .
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domingo, janeiro 20

Tudo vale a pena

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(Arquivo particular)

Uma frase muito conhecida e muito utilizada no discurso motivador, tanto em conversas informais como em palestras. No entanto, o que se observa muitas vezes é que as pessoas desconhecem a origem dela e o real contexto em que foi escrita.

A frase "Tudo vale a pena / se a alma não é pequena" faz parte do poema "Mar português" escrito por Fernando Pessoa (o próprio, ortônimo). O poema foi escrito em 1922 e publicado em 1934, no livro Mensagem, o único livro de Pessoa publicado em vida em língua portuguesa, pois, inicialmente, o poeta português escrevia muitos poemas em Inglês, língua em que foi educado.

Pessoa cantou seus reis, seus mares, seu povo sua terra. Foi sua fase de nacionalismo místico; em Mensagem, sua obra era um elogio a Portugal.

No breve poema "Mar português" ele fala das dores e glórias dos navegadores portugueses investidos das tarefas de cruzar mares desconhecidos e conquistar novos caminhos, novas terras. Apesar de todo o investimento material e humano, apesar de tantas vidas sacrificadas, valeu a pena! Diz o poema.

A expansão Ultramarina levou Portugal a uma posição de destaque mundial durante os séculos XV e XVI.

MAR PORTUGUÊS

Fernando Pessoa
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!

Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.

Quem quere passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

 
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Boa semana!
 
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sexta-feira, janeiro 11

Saudade da minha "aldeia"

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(Arquivo particular)

O clima chuvoso dos últimos dias torna a rotina mais caseira, mais sombria, mais íntima, e acaba por nos levar a momentos de introspecção. Numa dessas chuvas de verão (em casa, claro!) me vi lembrando da minha terra e das coisas boas que lá deixei. Aí a saudade é inevitável. Então me deu vontade de recitar Fernando Pessoa.

Ó sino da minha aldeia
 

Ó sino da minha aldeia,
Dolente na tarde calma,
Cada tua badalada
Soa dentro de minha alma.

E é tão lento o teu soar,
Tão como triste da vida,
Que já a primeira pancada
Tem o som de repetida.

Por mais que me tanjas perto
Quando passo, sempre errante,
És para mim como um sonho.
Soas-me na alma distante.

A cada pancada tua,
Vibrante no céu aberto,
Sinto mais longe o passado,
Sinto a saudade mais perto.


Fernando Pessoa

O poema (quadras em redondilha maior ou versos heptassílabos), que tem a gostosa sonoridade das trovas populares, destaca o passado e o espaço, o lugar do poeta, sendo esse lugar, neste poema, a sua interioridade não a sua terra propriamente. Lindo, não!
Fernando Pessoa

 
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sexta-feira, janeiro 4

Nunca deixe de tentar

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A crítica ácida costuma pesar a mão sobre os livros de autoajuda, motivacionais e gêneros similares, mas não podemos generalizar, há livros ruins em qualquer gênero. Nem tudo é joio, nem tudo é trigo.


Se as pessoas recorrem a este tipo de leitura é porque estão em busca de soluções para algum problema e não as encontraram na conversa com os amigos, parentes, colegas de trabalho ou professores. Acredito que alguns desses livros realmente possam ajudar as pessoas a visualizar melhor um problema. Contudo, não creio que fórmulas prontas para o sucesso, para a felicidade, para a prosperidade, sejam leituras recomendáveis. Como diz a critica, nestes casos, o livro só pode fazer bem a quem o escreveu.
 
Neste Natal ganhei de presente o livro do Michael Jordan, Nunca deixe de tentar (do original "I Can’t accept not trying"),comentado por Bernardinho. Na essência o livro é bem limitado; tirando os comentários o conteúdo não chegaria a 40 páginas, mas as dicas são boas. Elementares, porem interessantes. Às vezes, a gente esquece as regras mais fundamentais de sobrevivência. E é basicamente isto que o livro vem lembrar, o fundamental. Vale a pena dedicar uma hora do seu tempo para dar uma lida.
 
Bem resumidamente seria: Estabeleça metas para sua vida, comprometa-se seriamente com elas, mas dê um passo de cada vez, as ideias levam um tempo para amadurecerem; e não tema, o medo faz parte da luta, ele te resguarda do perigo e te faz buscar a defesa.
 
Portanto, um livro de autoajuda, um amigo, um parente, às vezes até as palavras puras de uma criança podem ser de grande valia numa hora de indecisão, mas um ponto é fundamental: ninguém poderá tomar a decisão por você. Por outro lado, se errar, não fique procurando desculpas ou culpados, da próxima vez faça a coisa certa. Mas, como sugere Jordan em seu livro, nunca deixe de tentar!


E feliz 2013, 2014, 2015...

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