Criança e livros por George Hodan
Tem
início o baile. Umas meio grosseiras outras mais elegantes; umas desbocadas,
outras politicamente corretas, uma a uma, entram na roda as palavras. Elas não
sabem, mas não estão ali por acaso; são de alguma forma as eleitas. Aos poucos,
arranjos aparentemente aleatórios vão se delineando. Sem pressa. São todas
estranhas ainda. Mas, passo a passo as afinidades vão aparecendo. Afinal, são
todas farinha (palavrinhas) do mesmo saco, do mesmo léxico. Algumas, um pouco
mais determinadas, tomam as iniciativas para que tudo possa fazer sentido
naquele grande salão (em) branco. Outras ficam de acompanhantes,
complementares; não obstante, muitas delas ainda prefiram o anonimato. Ficam
meio elípticas. Pelos cantos. Talvez aguardando serem cortejadas, solicitadas a
uma dança.
Não
demora e umazinha, mais atirada, promove encontros pelo salão, e logo se formam
laços mais consistentes, mais íntimos. Surgem a seguir as dependências e
subordinações. As mais nominativas, explícitas, dão nomes aos bois, e às vacas;
aos bezerros, ao campo, às arvores também. A todo o cenário, enfim. Revelam
suas qualidades e defeitos. Aquelas bem preposicionadas comandam os movimentos
em cena: pra lá, pra cá, sob, sobre, pra cima, pra baixo, assim, assado, pra
dentro, pra fora, e outras mais íntimas, inconfessas.
Firmadas
as posições, as conjunções se processam: sintáticas, vocabulares, quase
carnais. Uma vai com esse outra com aquele; sem medo, perante todos, com fé, sobretudo.
A
noite avança. A roda gira. O baile continua e múltiplos arranjos se dão. O
salão agora está cheio. As donas do baile, as palavras, estão fadadas a essa
eterna reorganização molecular, vocabular, semântica, discursiva, infinita. Mas,
ao final de cada dança elas já são bem íntimas, cheias de afinidades, pelo menos
até que a roda gire outra vez e dê outros sentidos às suas vidas.
Tire
uma delas para dançar, conduza-a para esta imensa pista de dança branca e, após
as devidas apresentações, construa com ela um discurso inédito, no seu ritmo,
lindo, que se realizará plenamente ao ser lido. Assim é o mundo das palavras:
infinitos arranjos e parcerias. Uma festa!
O trabalho O baile de Tony foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial 3.0 Não Adaptada.
Com base no trabalho disponível em http://vozativa2.blogspot.com.br/.