quarta-feira, fevereiro 6

O baile

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Criança e livros por George Hodan
 
Tem início o baile. Umas meio grosseiras outras mais elegantes; umas desbocadas, outras politicamente corretas, uma a uma, entram na roda as palavras. Elas não sabem, mas não estão ali por acaso; são de alguma forma as eleitas. Aos poucos, arranjos aparentemente aleatórios vão se delineando. Sem pressa. São todas estranhas ainda. Mas, passo a passo as afinidades vão aparecendo. Afinal, são todas farinha (palavrinhas) do mesmo saco, do mesmo léxico. Algumas, um pouco mais determinadas, tomam as iniciativas para que tudo possa fazer sentido naquele grande salão (em) branco. Outras ficam de acompanhantes, complementares; não obstante, muitas delas ainda prefiram o anonimato. Ficam meio elípticas. Pelos cantos. Talvez aguardando serem cortejadas, solicitadas a uma dança.

Não demora e umazinha, mais atirada, promove encontros pelo salão, e logo se formam laços mais consistentes, mais íntimos. Surgem a seguir as dependências e subordinações. As mais nominativas, explícitas, dão nomes aos bois, e às vacas; aos bezerros, ao campo, às arvores também. A todo o cenário, enfim. Revelam suas qualidades e defeitos. Aquelas bem preposicionadas comandam os movimentos em cena: pra lá, pra cá, sob, sobre, pra cima, pra baixo, assim, assado, pra dentro, pra fora, e outras mais íntimas, inconfessas.

Firmadas as posições, as conjunções se processam: sintáticas, vocabulares, quase carnais. Uma vai com esse outra com aquele; sem medo, perante todos, com fé, sobretudo.

A noite avança. A roda gira. O baile continua e múltiplos arranjos se dão. O salão agora está cheio. As donas do baile, as palavras, estão fadadas a essa eterna reorganização molecular, vocabular, semântica, discursiva, infinita. Mas, ao final de cada dança elas já são bem íntimas, cheias de afinidades, pelo menos até que a roda gire outra vez e dê outros sentidos às suas vidas.

Tire uma delas para dançar, conduza-a para esta imensa pista de dança branca e, após as devidas apresentações, construa com ela um discurso inédito, no seu ritmo, lindo, que se realizará plenamente ao ser lido. Assim é o mundo das palavras: infinitos arranjos e parcerias. Uma festa!

 
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O trabalho O baile de Tony foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial 3.0 Não Adaptada.
Com base no trabalho disponível em http://vozativa2.blogspot.com.br/.