domingo, maio 9

O dia nasce feliz

Comentaram (11)
 

As luzes da cidade ainda estão acesas, um pouco embaçadas pela umidade natural do alvorecer. Ainda é noite para muita gente. Contudo, para quem já se encontra na rua é possível, firmando o olhar para o nascente, perceber os primeiros sinais do raiar do dia; aquele lusco-fusco da madrugada. É um momento meio mágico, soturno até, para alguns, poder testemunhar a metamorfose da escuridão em luz, da noite em dia. Em ambiente fechado, iluminação artificial, não nos damos conta de fenômeno tão rotineiro e ao mesmo tempo tão místico, mas nesta hora todas as criaturas das trevas se recolhem.

Agora, já acomodado na poltrona da aeronave, assento do lado esquerdo junto à janela, percebo, ainda com algum esforço, a escuridão dando lugar aos primeiros raios de luz. A silueta cinzenta dos operadores de pista começa a tomar forma. Embora seja um fenômeno efêmero, é muito gradual. É preciso estar atento para perceber a noite fazer-se dia. Se fecharmos os olhos por alguns minutos, notaremos a diferença na intensidade da luz ao reabri-los.

O Airbus corre pela pista para a decolagem. Cada lâmpada da sinalização do aeroporto ao passar pela janela parece mais tênue que a anterior. Os contornos da cidade, no horizonte, vão ficando para trás. Esmaecem-se os contrastes. Quando ela despertar já será dia.


O avião despega-se do solo. Com isso, parece deixar ali as sombras, indo ao encontro da luz. Neste momento adentramos por um portal de transição. A atmosfera é ainda sem brilho e já quase não se vêem as luzes da cidade lá embaixo. Aliás, que cidade? Já a perdemos de vista!


Ao ultrapassarmos o primeiro teto de nuvens, aeronave ainda em ascensão, as coisas começam a clarear. Neste instante me dou conta de que estamos voando no sentido Norte-Sul, 05:30 da manhã, hora local. O visual a partir da minha janela é simplesmente magnífico! São momentos como este que nos proporcionam um encontro com o Criador, se é que isto seria possível por meio de um veículo que não é criação Dele.

Não desgrudo o olhar da janela. Tenho o Nascente à minha esquerda. O sol não tarda a aparecer. Uma pequena calota da esfera solar começa a brotar flamejante por detrás da imensa planície branca formada naquela altitude pelo colchão de nuvens. A julgar pelo visual tem-se a impressão de que seria possível caminhar sobre tão estável “superfície”. Continuaremos subindo até uma altitude de cruzeiro de 28 mil pés.

A coloração do sol agora é de um dourado vibrante, meio âmbar. A pequena porção já à mostra é o bastante para fazer brilhar toda aquela imensa superfície abaixo de nós. Seu fulgor, sobre as nuvens, ofusca a visão como a brancura glacial. A pureza da paisagem é inesquecível. Já não consigo olhar diretamente para a luz, que fica cada vez mais forte, resplandecente. A gente nem se da conta de que lá fora a temperatura gira em torno dos 60° Celsius negativos.

Enquanto assistia aos últimos instantes do “milagre do dia”, do nascimento do luminar maior, algo interrompe meu encantamento:

- Café, suco ou refrigerante senhor? – O serviço de bordo.

- Hã! Água, por favor. Surpreso, nem me liguei muito no cardápio. Aliás, durante um espetáculo daqueles nada seria assim tão urgente.

Distraído por alguns minutos com o lanche, ao tornar a olhar para janela percebo que o sol já se encontrava completamente desnudo, despertado. Sua luminosidade, intensamente dourada, e calor ameno invadiam a cabine. Temperatura ambiente 19 graus. Lá fora, o céu de um azul imaculado, e abaixo a planície branca de nuvens, só comparável a um deserto de sal ou uma paisagem polar, davam ao observador a sensação de equilíbrio e serenidade. Uma visão de tirar o fôlego. Aquele com certeza seria um lindo dia!

Mais tarde, com os pés no chão, enquanto me desloco para o almoço, trânsito intenso, calor escaldante, pedestres acotovelando-se nos semáforos, percebo pela sombra quase nula de meu corpo que o sol está a pino. O relógio da esquina, alternando suas funções digitais, marca a hora e a temperatura de... 40 graus, à sombra. Bobagem! Hoje nada me aborrece! O dia nasce feliz, a gente só precisa se deixar energizar, contagiar. A temperatura é apenas um detalhe.

Boa semana a todos!

E um lindo dia para as mamães!

Comentários (11)

Carregando... Logando...
  • Logado como
O dia nasce feliz, nós acordamos felizes, mas por vezes nos perdemos em meio aos infortúnios do dia a dia.
Belo Texto
1 resposta · ativo menos de 1 minuto atrás
Oi Paulo,

Prazer te ver por aqui. É verdade, às vezes deixamos uma "pedra" estragar algo que nasceu tão belo.

Abraço
Há um sol para cada um de nós! Tem texto meu no Só Pensando. Um abraço.
http://submundosemmim.blogspot.com
http://so-pensando.blogspot.com/2010/05/e-que-sej...
Olá!

Sempre amanhece um dia para cada um de nós todos os dias. O que devemos fazer é não deixarmos esse dia que nasce morrer sem termos realizado nada de importante.

Abraços

Francisco Castro
1 resposta · ativo 778 semanas atrás
Bem lembrado amigo.
Não deixe que o sol se popnha sem que vc tenha algo novo pra contar.

abraço e obrigado pelos comentários.
Na música Epitáfio talvez seja esta a ideia:

- Ver o sol nascer;
- Ver o sol se por!

Ou seja, viajem de avião!
1 resposta · ativo 778 semanas atrás
É isso Adão,

Se vc se refere à musica dos Titãs, é isso aí.
Muita gente passa pela vida sem se dar conta que o sol nasce lido a cada dia. Tem lugares que proporcionam um visual incrivel do nascer e por do sol.

Abraço
obrigada por me fazer viajar com você em suas palavras...

realmente ver um dia nascer é presenciar o milagre da vida...

lindo texto...

beijo
1 resposta · ativo 778 semanas atrás
Grato Solange,

Tenha uma boa semana!
O dia sempre nasce feliz, pelo menos para a maioria das pessoas, entretanto nem sempre aproveitamos o melhor dele.
1 resposta · ativo 778 semanas atrás
Verdade Joselito,

A gente nem sempre aproveita as coisas simples e belas da vida.

Boa semana pra vc.

Postar um novo comentário

Comments by