terça-feira, setembro 30

Um livro que vale a pena ser lido...

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Um dos mais belos livros que já li “As Boas Mulheres da China”, escrito pela radialista e jornalista chinesa, Xinran;

Xinran coletou inúmeros relatos sobre a vida da mulher chinesa contemporânea durante os oito anos em que comandou o programa da rádio de Pequim "Palavras na brisa noturna", entre 1989 e 1997 e no livro conta as histórias reais de mulheres de várias idades e condição social, vítimas da humilhação e do abandono: casamentos forçados, estupros, desilusões amorosas, miséria e preconceito.

Uma das histórias que mais me emocionou é a de Hongxue, uma menina estuprada pelo pai desde os 11 anos de idade e que arruinou deliberadamente sua saúde para se refugiar num hospital. Hongxue descobriu o afeto ao ser acariciada não por mãos humanas, mas pelas patas de uma mosca, o único toque gentil que recebeu na vida. Sua única felicidade foi quando soube que iria morrer e não retornaria jamais para a casa do pai.

Algumas histórias outras narradas no livro:

* Uma menina foi vendida em casamento para um velho e acorrentada, sem que os moradores do povoado ou as autoridades se dispusessem a interferir - isso porque existem ''36 virtudes, mas não ter herdeiros é um mal que nega todas elas'', e o velho estaria, portanto, no direito de assegurar sua continuidade. Mas, preocupada, uma pessoa da aldeia mandou uma carta anônima para Xinran, pois a menina estava para morrer por causa dos ferimentos causados pelas correntes. Ela implorava, no entanto, para que Xinran fosse discreta, pois se descobrissem quem havia denunciado, ela seria escorraçada da aldeia. Trecho do livro: ''A garota tinha só doze anos. Nós a tiramos do velho, que chorava e praguejava amargamente. (...) Não recebi nenhum elogio por salvar a menina, só críticas por 'deslocar soldados, causar agitação entre as pessoas' e desperdiçar o tempo e o dinheiro da emissora. Fiquei abalada com essas queixas. Havia uma garota em perigo e, ainda assim, ir em socorro dela foi visto como 'exaurir as pessoas e drenar o Tesouro'. Quanto valia, exatamente, a vida de uma mulher na China?'';

* Alijada da presença do filho, uma mãe passa-se por catadora de lixo só para vê-lo diariamente. Quando mais nova, o marido morreu prematuramente juntamente com um dos dois filhos e, após pensar em suicídio, criou o único filho que lhe restara. Este obtém sucesso, mas a mãe permanece fora de sua vida;

* Frustrado por não ter um filho, o pai de uma menina a criou como um menino e, depois de estuprada por um grupo de homens, passou definitivamente a abominar o contato com o sexo oposto e apaixonou-se por uma ativista homossexual que lhe ensinou sobre os prazeres da sexualidade;

* A filha de um general da facção de Chan-Kai-Chek, considerado traidor na época da Revolução, enlouquece. Os homens aproveitam-se dessa fraqueza e estupram a menina seguidamente até que a família a encontre em um estado de quase catatonia.

Perto da metade do livro, o leitor conhece quais são as três submissões e quatro virtudes das mulheres no pensamento masculino chinês: ''submissão ao pai, em seguida ao marido e, depois da morte deste, ao filho. As virtudes: fidelidade, encanto físico, decoro na fala e nos atos, e diligência no trabalho doméstico''.

E por fim, Xiram narra o motivo que a fez abandonar a China e se mudar para Londres: a Colina dos Gritos, uma comunidade onde as pessoas não têm casas e moram em cavernas, não há fogão ou panelas, a comida é escassa, não há roupas para as meninas, a maioria das mulheres têm útero caído e utiliza folhas no período menstrual causando-lhes feridas nas coxas.

O livro foi inspirado em perguntas que uma universitária lhe propôs quando se encontraram: ''Qual é a filosofia das mulheres? O que é a felicidade para uma mulher? E o que faz uma boa mulher?''

Um livro belíssimo, emocionante, informativo e que vale a pena ser lido.